Outubro Missionário - Dia 17

 




Quinta-feira, 17 de Outubro de 2024

XXVIII Semana do Tempo Comum – Ano B

Memória de Santo Inácio de Antioquia, bispo e mártir

Ef 1, 1-10; Sal 97; Lc 11, 47-54

Hoje celebramos a memória de Santo Inácio de Antioquia, bispo e mártir, e as leituras permitem-nos abordar o mistério da vida do profeta-mártir, do apóstolo-mártir. Embora o Evangelho seja uma continuação do que lemos ontem, hoje o tom dramático é mais acentuado, de tal modo que, no final, Jesus é atacado pelos escribas e fariseus que o tinham convidado para jantar.

Recordemos o contexto: Jesus tinha sido convidado para comer em casa de um fariseu e o Seu anfitrião parecia surpreendido pelo facto de Jesus não ter feito as abluções rituais, a lavagem antes de comer. Este jantar parece ser narrado tendo em mente o chamado simpósio grego, ou seja, uma refeição solene em que os convidados discutiam questões filosóficas enquanto comiam e bebiam. O narrador de Lucas utiliza este cenário tão familiar aos seus leitores.

“Ai de vós, porque edificais os túmulos dos profetas, quando foram os vossos pais que os mataram.” Esta acusação de perseguir e matar os profetas, que são a consciência de todo um povo, atravessa o Evangelho de Lucas a partir do Sermão da Montanha (Lc 6, 22-23) e é retomada nos Actos dos Apóstolos (Act 7, 52). Jesus identifica-Se como profeta (Lc 4, 24; 13, 33-34).

A acusação de construir túmulos para os profetas é um insulto que Jesus esclarece imediatamente, afirmando que a geração daquele tempo não é melhor do que a anterior e apenas dá continuidade à matança sistemática dos profetas e mensageiros de Deus. Precisamente por causa dessa continuidade, a construção de túmulos, monumentos e lápides em honra dos profetas assassinados acaba por ser uma forma de celebrar a sua morte violenta e, portanto, de a aprovar.

“É por isso que a Sabedoria de Deus disse: ‘Eu lhes enviarei profetas e apóstolos; e eles hão-de matar uns e perseguir outros’. Mas Deus vai pedir contas a esta geração do sangue de todos os profetas, que foi derramado desde a criação do mundo.” Jesus relata uma afirmação da sabedoria de Deus; o curioso é que a frase citada não se encontra nem no Antigo Testamento nem nos outros escritos do tempo. Pode ser visto como um convite a identificar o próprio Jesus como essa sabedoria personificada.

Jesus prediz então a morte de alguns dos Seus missionários, incluindo a Sua própria. Mas essas mortes, diz o Senhor, não serão esquecidas, nem ficarão impunes; pelo contrário, a responsabilidade e as consequências dos danos causados devem ser assumidas. Como diria anos mais tarde Santo Inácio de Antioquia: “Eu sou o trigo de Deus: é preciso que ele seja triturado pelos dentes das feras a fim de ser considerado puro pão de Cristo.” A justiça divina, que transforma o mal em bem, alcançará todos os actos de perseguição e de assassínio cometidos ao longo da história.

Deste modo, Jesus faz-nos ver uma relação entre o comportamento do povo de Israel, que rejeita os profetas e os mensageiros de Deus, e o que Lhe acontecerá a Ele em Jerusalém, depois aos Seus apóstolos e, mais tarde, a tantos missionários no mundo, até hoje.

“Ai de vós, doutores da lei, porque tirastes a chave da ciência.” Jesus, em nome de Deus, exprime a Sua indignação profética contra este grupo de fariseus, porque o seu comportamento revela uma interpretação errada da lei, e tudo isto apesar do facto de o seu papel no meio do povo ser precisamente o de guias, e, no entanto, eles revelaram-se como líderes corrompidos para aqueles que os escutavam. Tinham “a chave da porta da ciência”, mas parece que não entraram nem tenham deixado entrar ninguém.

Nós, missionários, não podemos ficar com o que recebemos porque, como ouvimos na Carta aos Efésios: “Segundo a riqueza da Sua graça, que Ele nos concedeu em abundância, com plena sabedoria e inteligência. Ele deu-nos a conhecer o mistério da Sua vontade.”

“Quando Jesus saiu dali, os escribas e os fariseus começaram a persegui-l’O terrivelmente e a provocá-l’O com perguntas sobre muitas coisas, armando-Lhe ciladas, para O surpreenderem nalguma palavra da sua boca.”

Tudo acaba em hostilidade aberta. Jesus, que é claramente amigo dos cobradores de impostos e dos pecadores, dos proscritos, dos impuros, não se recusa a comer com um homem que pertence a um dos grupos mais intransigentes na interpretação da lei. No entanto, faz-lhes ver como se desviaram. Construíram uma religião de boas práticas, mas sem alma libertadora, e refugiaram-se num compromisso exterior formal e inflexível, mas sem misericórdia nem compaixão. Assim, sufocaram o Espírito que sopra onde quer, transformando a religião num escrupuloso aparelho de prescrições. Perderam o núcleo da sua missão, que é explicar e interpretar as Escrituras. Mostraram-se maus mestres, incapazes de compreender o sentido das próprias Escrituras e de transmitir aos outros o desígnio do amor de Deus nelas revelado, pelo menos de reconhecer o Enviado do Pai, Jesus de Nazaré, e afastaram-se do desígnio projectado por Deus que, como diz S. Paulo, é “instaurar todas as coisas em Cristo, tudo o que há nos Céus e na terra” (Ef 1, 10).

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