Terça-feira,
15 de Outubro de 2024
XXVIII
Semana do Tempo Comum – Ano B
Memória de
Santa Teresa de Jesus, Virgem e Doutora da Igreja
Gl 5, 1-6; Sal 118; Lc 11,
37-41
As palavras
dirigidas aos fariseus são fortes, desafiadoras e devem ser escutadas com
particular atenção. Escutemo-las de novo: “Vós, os fariseus, limpais o exterior
do copo e do prato, mas o vosso interior está cheio de rapina e perversidade. Insensatos!
Quem fez o interior não fez também o exterior? Dai antes de esmola o que está
dentro e tudo para vós ficará limpo.” O que é que deve ser purificado? O
interior ou o exterior? Por dentro estão cheios de cobiça e maldade... O
problema não é o exterior, a aparência, mas o nosso coração, todo o mal que
nele podemos esconder: a avareza, a maldade e todo o tipo de maus pensamentos.
De facto, o
Senhor convida-nos a reflectir sobre a nossa hipocrisia, as nossas aparências,
tudo o que fazemos para nos tornarmos belos aos olhos dos outros, enquanto o
nosso coração não corresponde ao que apresentamos no exterior. Jesus
convida-nos a cuidar do nosso coração, daquilo que nos torna profundos no nosso
ser. Como sempre, o Senhor exorta-nos a uma conversão radical. Aqui, propõe-nos
que demos em esmola tudo o que temos e tudo ficará limpo para nós. Deixaremos
de ter o desejo de possuir mais e mais, de acumular riquezas ou de parecer
belos, correndo o risco de sermos egocêntricos.
O Senhor
pede-nos, portanto, uma purificação, mas não uma purificação qualquer. Não se
trata de formalismo legal, de abluções repetidas, de lavagens profundas, nem
mesmo de nos afastarmos dos pecadores que parecem exalar impureza. Não se trata
de evitar sepulturas e impurezas aleatórias. A única purificação é a interior,
explica Jesus: nada do que vem do exterior pode tornar o homem impuro, porque é
do interior, do coração dos homens, que emergem os maus desígnios (Mc 7,
14-23). Trata-se de um ensinamento novo e libertador, que os discípulos têm
dificuldade em apreender, em compreender. Sem dúvida que, para cada um de nós,
é mais fácil lavar o exterior do que limpar o interior, os nossos pensamentos,
o nosso coração e todo o mal que ele pode conter, todo o mal que muitas vezes
desejamos aos outros.
O que aqui é
posto em evidência é a simplicidade da fé e do amor, a direcção para a qual os
discípulos devem gravitar, ou seja, o coração puro: “Felizes os puros de
coração, porque verão a Deus” (Mt 5, 8). Esta pureza é a da essência da
pessoa, encerrada na palavra espírito. Os pobres de coração são também os
pobres em espírito. É o núcleo e o todo da pessoa. Pensemos no Salmo 34,
19 onde está escrito: “O Senhor está perto dos corações atribulados e salva os
que estão de espírito abatido.” Estes pobres fazem parte da grande família dos
que passaram por provações materiais e espirituais e só podem contar com a
ajuda do Senhor. Cada um deles pode dizer com confiança: “Sou pobre e
necessitado, o Senhor cuida de mim” (Sl 40, 18). A evangelização dos
pobres, com milagres, é o sinal dado por Jesus aos enviados de João Baptista,
para que reconheçam que Ele é o Messias esperado (cf. Mt 11, 5). O pobre
espera a salvação do Senhor e, confiante, espera e executa a vontade do seu
Senhor. A sua alma responde aos Seus pedidos e às Suas ordens. Ele está
confiante de que o seu grito e a sua oração chegarão aos ouvidos do Senhor, que
o salvará segundo a sua promessa. Ele já pode cantar o louvor do Senhor.
Cristo
libertou-nos para que sejamos livres, explica o apóstolo Paulo. Por isso, somos
convidados a mantermo-nos firmes. “Permanecei, pois, firmes e não vos deixeis
sujeitar de novo a um jugo de servidão” (Gal 5, 1), explica o apóstolo.
Para ver Deus, para apresentar-se a Ele, já não no Seu templo de Jerusalém, mas
no Seu Reino, a pureza moral já não é suficiente. É necessária a
presença activa do Senhor na vida quotidiana; é necessário o amor, a presença
de Deus-Amor; então o homem será puro em todos os sentidos. De facto, Jesus
explica aos Seus apóstolos: “Vós já estais limpos, por causa da palavra que vos
disse” (Jo 15, 3). “Quem tomou banho não tem necessidade de lavar senão
os pés, pois está inteiramente puro” (Jo 13, 10).
Falando de
alimentos, Pedro é levado a tirar uma tripla conclusão: já não há alimentos
impuros (cf. Act 10, 15; 11,9); os próprios incircuncisos já não estão
contaminados (cf. Act 10, 28); é pela fé que Deus purifica agora o
coração dos gentios (cf. Act 15, 9). Paulo esclarece a questão da
pureza, afirmando que, para o cristão, “nada é impuro em si mesmo” (Rm
14, 14). Cessando o domínio da antiga Lei, as observâncias da pureza tornam-se
“prescrições estéreis”, das quais Cristo nos libertou (cf. Gal 4, 3.9; Col
2, 16-23). Cristo entregou-Se pela Igreja, para a santificar através da
purificação com o banho de água (cf. Ef 5, 26). Não se trata de uma
purificação exterior, porque as águas do baptismo libertam-nos de toda a
mancha, associando-nos a Jesus Cristo ressuscitado (1, 3.21). De facto, somos
purificados pela esperança em Deus que, por Cristo, nos fez filhos adoptivos
(cf. 1 Jo 3, 3). Como cristãos, devemos purificar-nos desde já de toda a
contaminação do corpo e do espírito para completar a obra da santificação (cf. 2
Cor 7, 1). “Tudo é puro para aquele que é puro” (Tt 1, 15) e agora o
que conta diante de Deus é a disposição profunda de um coração regenerado e
renovado (cf. 1 Tm 4, 4). A caridade cristã nasce de um coração puro, de
uma boa consciência e de uma fé recta (cf. 1 Tm 1, 5). Que alegria
servir o Senhor com uma consciência pura (2 Tm 1, 3)! O contrário da
impureza é a santidade (1 Ts 4, 7s; Rm 6, 19). De facto, somos
convidados a ir ter com Cristo, morto e ressuscitado; é Ele que nos purifica e
nos liberta de todo o mal.
Como podemos
evangelizar se nos afastamos das pessoas que consideramos impuras, pecadoras,
contaminadas? Como podemos evangelizar se não vamos ao encontro dos nossos
contemporâneos, dos nossos irmãos e irmãs, independentemente das suas
convicções religiosas e graus de santidade? Cabe a cada um de nós, discípulos
missionários, fazer brotar dos nossos corações puros a justiça e a fé, a
caridade e a paz, sem esquecer o dinamismo missionário. O Espírito é-nos dado
para avançarmos no caminho da santidade, do amor e da justiça. A Igreja
oferece-nos os sacramentos e vários outros meios para seguir o Senhor Jesus.
Vós que procurais a justiça através da Lei, se vos separastes de Cristo, perdestes
a Graça se não confiais na misericórdia e na ternura de Deus, se não acreditais
no Espírito santificador. Discípulos de Cristo, é pelo Espírito e na fé que
devemos esperar a justiça esperada e crescer na santidade. Porque, em Cristo
Jesus, o que vale não é o facto de se ser circuncidado ou não, mas uma fé que
actua pela caridade.
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