Sábado, 25 de Outubro de 2025
XXIX Semana do Tempo Comum – Ano Ímpar (I)
Rm 8, 1-11; Sl 23; Lc
13, 1-9
O ensinamento
de Jesus, no Evangelho de hoje, começa por uma notícia que Lhe é dada por
pessoas anónimas: o caso de vários galileus massacrados por Pilatos, enquanto
ofereciam um sacrifício no Templo. A condenação não só é executada dentro das
muralhas do Templo, mas, ainda por cima, o sangue humano é misturado com o dos
animais sacrificados, o que provoca uma grande vergonha e indignação. Não é
claro o motivo pelo qual as pessoas contam este episódio a Jesus. Talvez
porque, sendo Jesus um galileu, O tivessem querido pôr de sobreaviso –
precisamente como acontece imediatamente a seguir, por causa da perseguição de
Herodes Antipas, que O queria matar. Ou então, tratava-se de uma sórdida
ameaça, porque, se Jesus tivesse sido denunciado ao procurador romano, talvez
tivesse sofrido a mesma sorte; ou, pura e simplesmente, pelo gosto de
bisbilhotar sobre as tragédias alheias: as pessoas que se alegram com os males
dos outros deviam calar-se; aqueles que rejubilam com as doenças dos outros
deveriam ter vergonha.
A resposta de
Jesus, porém, leva-nos a pressupor a presença de qualquer coisa ainda mais
grave nessa gente: um juízo condescendente em relação às vítimas, como se estas
merecessem morrer dessa forma tão violenta, no momento sagrado da adoração a
Deus; como se a brutalidade dos romanos fosse um juízo de Deus contra aqueles
que tinham sido mortos. Jesus não comenta o acontecimento, mas dá uma lição àqueles
que Lhe falam daquele triste episódio: a ninguém é permitido interpretar o
sofrimento, a doença, os acidentes e as tragédias dos outros como castigo
divino pelos pecados cometidos, mas cada um deve considerar os seus próprios
pecados como a pior desgraça e tentar converter-se com sincero arrependimento.
A ninguém foi dada autoridade para julgar e dividir as pessoas,
classificando-as como “boas” ou “más”. Só o Senhor conhece toda a verdade dos
nossos corações.
Mal a notícia
Lhe é comunicada, Jesus rejeita imediatamente a leitura segundo a qual haveria
uma ligação causal entre a morte violenta e a enormidade do pecado. Jesus quer
sublinhar que os incidentes não revelam necessariamente a gravidade de algum
pecado escondido da pessoa que deles é vítima, mas são como que advertências,
recordando-nos que a morte pode bater sempre à nossa porta, e sobretudo quando
menos o esperamos. Daí a tomada de consciência de que cada um deve despertar
para a necessidade e a urgência da conversão interior, que deve ser aceite e
posta em prática antes que seja tarde demais. É por isso que Jesus, rejeitando
a ideia de que os judeus massacrados por Pilatos e as dezoito pessoas esmagadas
pelo desmoronamento da torre de Siloé possam ser considerados mais pecadoras do
que as outras, prossegue o Seu discurso dando a entender que se aqueles que O
escutam não se converterem, poderão perecer do mesmo modo. Converter-se, não
porque o seu arrependimento os protegeria da morte, mas porque a conversão
dispõe bem a pessoa, tanto espiritual como humanamente, para o encontro com o
Senhor da vida, em total paz e serenidade de coração. Se a conversão pode
libertar da morte, é da morte eterna, e não já do desaparecimento físico. A
imagem de Deus subjacente à ideia segundo a qual a morte violenta revelaria um
grave pecado da vítima não corresponde ao Deus-Pai revelado por Jesus. Ele não
é um Deus que Se vinga dos pecadores, mas um Deus paciente, que espera,
concedendo o tempo necessário, até que, a um dado momento, a humanidade acabará
por se aperceber do amor louco com que é amada, o que lhe trará os frutos do
amor fraterno e da solidariedade que espera.
De qualquer
modo, é esta a perspectiva indicada pela parábola, o ponto teológico que ela
dramatiza com a ajuda da história de um homem, da sua figueira e da sua vinha.
Desiludido por não ter recebido os frutos que tinha o direito de esperar, ao
fim de tantos anos de cuidados e de trabalho, o homem decide cortar a sua
figueira pois não seria bom continuar a deixá-la esgotar a terra em vão. Para
sua surpresa, porém, o seu vinhateiro intervém, intercedendo por que seja
concedida àquela figueira uma prorrogação, o tempo necessário para verificar
se, trabalhando e adubando a terra, a situação não poderia mudar. A sequência
da história não é contada, mas a execução do veredicto parece ter sido
suspensa; tal facto abre caminho à esperança. Se nos virmos reflectidos na
imagem da figueira, a boa notícia é que o tempo de vida que nos é dado pelo
Senhor do universo abre-nos um espaço para deixarmos que a graça divina actue e
produza os seus frutos de paz, de alegria, de justiça e de amor em nós. É um
presente, uma espécie de segunda oportunidade, agora sem margem de erro. Por
outro lado, se somos representados pela figura do vinhateiro, devemos entrever
nela a nossa parte de intercessão e os esforços que devemos fazer como
contributo a oferecer pela conversão alheia. Como comunidade eclesial, é evidente
que somos chamados a um duplo empenho: convertermo-nos sem desanimar,
tornando-nos cada vez mais transparentes frente à palavra de Deus e dóceis ao
Espírito de amor que vivifica; e prodigalizarmo-nos pela conversão do mundo,
sem ofuscar o rosto misericordioso e paciente de Deus, Pai de Jesus Cristo,
cuja primeira e única vontade é salvar e não condenar. Mostra a experiência que
se pode obter do coração humano, transmitindo-lhe confiança: não conquistamos
as pessoas para o amor divino metendo-lhes medo ou aprisionando-as nas suas
desgraças. Possa esta pedagogia guiar a nossa acção missionária sem que isso
atenue a sua perspicácia profética ou a sua profunda compreensão da natureza
humana e do conteúdo da salvação.
A imagem da
figueira plantada na vinha talvez sugira que o Reino de Deus (a vinha) é muito
maior do que Israel ou do que Jerusalém, representados pela figueira. Assim,
Jesus, o Messias, o divino viticultor, veio procurar na Cidade Santa frutos de
misericórdia, de justiça e de fidelidade. São estes os frutos que agradam a
Deus, os frutos esperados pelo “proprietário da vinha”. Contudo, o tempo está a
chegar ao fim e a decisão de cortar a figueira é tomada, visto não terem sido
encontrados esses frutos. Também é este o significado do episódio da figueira
estéril de Marcos (Mc 13, 28) e de Mateus (Mt 21, 18-22;
24,32), que levou à maldição da árvore.
Surpreendentemente,
porém, na parábola de Lucas, é o viticultor que intercede junto do
proprietário, para que tenha um pouco de paciência com a sua figueira e,
portanto, para que tenha misericórdia de Jerusalém. E como se isso não
bastasse, ele próprio se empenha em fazer todos os possíveis por tornar
frutífera essa árvore tão amada. Porque decerto, como o profeta Ezequiel
declara na aclamação do Aleluia, Deus não sente prazer pela morte dos malvados;
pelo contrário, deseja a sua conversão, para que possam abandonar o seu
percurso errado e a sua vida de pecado. «Convertei-vos do vosso mau
comportamento! Porque quereis morrer, israelitas?» (Ez 33, 11)
Infelizmente, o convite à conversão não foi aceite, as advertências não foram
escutadas, os sinais não foram entendidos, e o tempo da graça não foi
aproveitado. No entanto, antes que se verificasse a tragédia final de
Jerusalém, Jesus, a própria Árvore da Vida, aceitou ser cortada a fim de que a
raiz de todos os males acabasse por ser extirpada e pudesse germinar no nosso
coração, vivificando-o eternamente com a seiva do Espírito Santo.
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