Para um rosto missionário da Igreja em Portugal III

Evangelização: o primeiro e o melhor serviço


9. Na Carta Apostólica Redemptoris Missio, o Papa João Paulo II escreveu assim: «O que me anima mais a proclamar a urgência da evangelização missionária é que ela constitui o primeiro serviço que a Igreja pode prestar ao homem e à humanidade inteira, no mundo de hoje, que, apesar de conhecer realizações maravilhosas, parece ter perdido o sentido último das coisas e da sua própria existência»[14]. Neste contexto, a proclamação da Boa Nova a todos os povos e em todas as culturas continua a ser o melhor serviço que a Igreja pode prestar às pessoas. Não podemos, portanto, deixar de testemunhar que também hoje é possível, belo, bom e justo viver a existência humana de acordo com o Evangelho, e empenhar-nos, por isso e para isso, em «viver uma vida verdadeira, plena, bela, de tal modo bela, que não seria possível explicá-la se Cristo não tivesse morrido e se não tivesse verdadeiramente ressuscitado»[15].

10. «Deus amou-nos primeiro» (1 Jo 4,19). Devemos, portanto, saber ser testemunhas credíveis deste amor excessivo, superabundante, que vai para além do necessário, que revela uma misericórdia sem medida, de modo a parecer incrível, dado que não é medido pela necessidade do homem, mas pela riqueza infinita da benevolência de Deus. Compete a cada cristão fazer com que o Evangelho de Jesus Cristo se possa tornar lugar de encontro, feito de fascínio e de espanto, com o mistério da pessoa e da obra de Jesus Cristo que, mesmo sobre a Cruz, manifesta plenamente a beleza e a força do amor de Deus, como canta Santo Agostinho: «belo a dar a vida e belo a retomá‑la; belo na Cruz, belo no sepulcro, belo no céu»[16].

11. Se não estivermos entusiasmados pela profundidade e pela beleza da nossa fé, não podemos verdadeiramente transmiti-la nem aos vizinhos nem aos filhos nem às gerações futuras. Neste tempo em que, no sentir de muitos, a fé cristã deixou de ser património comum da sociedade, não bastam os discursos, os apelos morais ou os acenos genéricos aos valores cristãos, ainda que estes continuem a ser indispensáveis. É sabido, de facto, que «a mera enunciação da mensagem não chega ao mais fundo do coração da pessoa, não toca a sua liberdade, não muda a vida». Num tempo assim, «aquilo que fascina é sobretudo o encontro com pessoas crentes que, pela sua fé, atraem para a graça de Cristo, dando testemunho d’Ele»[17]. Num tempo como este, já não é suficiente reformar estruturas. É necessário converter a nossa vida, expondo-nos permanentemente àquela rajada de verbos do Senhor Jesus: «vai», «vende», «dá», «vem» e «segue-Me» (Mc 10,21), e transformarmo-nos em testemunhas de Cristo Ressuscitado no nosso ambiente e em toda a parte. Já não basta conservar as comunidades já existentes, ainda que isso seja importante. Entre tantas urgências, todos temos de reconhecer que o mais urgente é ainda e sempre a missão. É, portanto, necessário e inadiável levantar-se e partir em missão[18].


[14] JOÃO PAULO II, Redemptoris Missio, 2.

[15] F. LAMBIASI, La partecipazione dei laici alla vita e alla missione della Chiesa, CONGREGAÇÃO PARA OS BISPOS, Duc in altum. Pellegrinaggio alla Tomba di San Pietro. Incontro di Riflessione (Roma, 15-23 settembre 2008), Città del Vaticano, Libreria Editrice Vaticana, 2008, p. 276.

[16] SANTO AGOSTINHO, Enarrationes in Psalmos 44,3.

[17] BENTO XVI, Discurso no Encontro com os Bispos de Portugal, Fátima, 13 de Maio de 2010.

[18] BENTO XVI, Homilia da Santa Missa, Grande Praça da Avenida dos Aliados, Porto, 14 de Maio de 2010. Ver também a Homilia do Cardeal Cláudio Hummes, Prefeito da Congregação para o Clero, na Santa Missa de 9 de Junho de 2010, Conclusão do Ano Sacerdotal, Basílica de São Paulo Fora de Muros.


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