«Não podemos calar o que vimos e ouvimos» Mensagem da Comissão Episcopal de Missões e Nova Evangelização


 1. Como a água transbordante não pode ficar retida no cântaro já repleto, também o encontro com Cristo Ressuscitado transmite uma plenitude e alegria que nenhum limite pode conter. Extravasa sob a forma de testemunho e de anúncio! A Igreja é a comunidade viva resultante da experiência de amor vivido por pessoas concretas, ao encontrarem Jesus Cristo. Encontro esse que representa a salvação da pessoa porque a resgata das muitas escuridões onde mergulha – das escuridões pessoais, de sofrimento e desencanto; das escuridões existenciais, de ausência de sentido e de esperança; das escuridões éticas, feitas de vazio e mediocridade – para lhe oferecer um ser renovado e novas possibilidades de vida.

Os Evangelhos são concordes em apresentar homens e mulheres que, devido ao encontro com Jesus, receberam a graça da salvação, entenda-se: foi-lhes dado uma nova vida, renovaram-se enquanto pessoas, converteram-se aos maravilhosos paradigmas de Deus. Assim, Zaqueu, Maria Madalena, Pedro, Paulo, o Leproso, o cego Bartimeu, os discípulos de Emaús…todos eles contemplados com a graça da salvação oferecida pelo deslumbrante encontro com Cristo. Experiência de tal modo marcante e decisiva que a não puderam calar. Partilharam-na, tiveram de a levar e dar a conhecer ao mundo. E a nós, que acolhemos os seus testemunhos, toca-nos verificar, não só como se tornaram efetivamente pessoas redimidas, mulheres e homens que se reencontraram com a vida e se sintonizaram com os desígnios amorosos de Deus, mas também como a sua grande alegria era a certeza de que essa graça da nova vida estava feita para ser para todos. E inebriava-os sentirem que eles próprios, ao mesmo tempo que eram recriados, ficavam ipso facto capacitados para serem mediadores dessa salvação junto dos outros e do mundo inteiro.

Esse imperativo missionário, de anunciar o que se viu, ouviu e tocou, é a outra face da graça da salvação.

2. Só Cristo preenche o coração do ser humano, dando-lhe sentido e completude. Ele não é um mito, nem uma ficção, mas Aquele que sacia a nossa sede e fome de infinito. O autêntico encontro com Ele transfigura-nos a nós e à vida, fazendo-nos saborear a doçura do amor, aparentemente impossível pela nossa debilidade, mas capaz de preencher os espaços da vida e da alma. Alimentados por essa força de gratuidade eletiva, que supera todos os preconceitos sobre nós e sobre os outros, na certeza de sermos amados gratuita e incondicionalmente, sem restrições, nem limites, descobrimos que nós próprios, na totalidade da nossa parábola de vida, nos constituímos como canal de transmissão, para os irmãos, da água viva da salvação, Cristo Senhor Ressuscitado. Não só o nosso anúncio explícito, mas o nosso ser, agora transfigurado pela inebriante luz da esperança e da vida.

A este propósito evoco a história, tão a propósito do Dia Mundial das Missões, sobre dois antigos exploradores do Oeste americano quando descobriram um filão de pepitas e decidiram não o dizer a ninguém. Queriam guardar o segredo só para si. E, com esse propósito, no domingo seguinte, lá desceram à aldeia, como faziam sempre nesse dia todos os outros exploradores, para participarem nas ações religiosas, abastecerem-se de mantimentos para a semana, conviverem, divertirem-se e partilharem conversas. Aparentemente, tinha sido um domingo normal, tudo correra como sempre e nenhum dos dois dissera a ninguém o segredo. Ao aproximar-se a noite, regressaram às suas cabanas. Mas eis que, depois de terem caminhado algum tempo, perceberam que eram seguidos, alguém vinha no encalce deles. E quantos?! Não era um, nem dois, nem…mas era a aldeia inteira que os seguia. Surpreendidos, perguntaram porque os seguiam. A resposta foi: «Vocês encontraram oiro!» Cada um deles desconfiou do outro. Mas ambos negaram tê-lo feito. Então perguntaram aos que os seguiam como souberam, e a resposta foi desarmante: “Nós vimo-lo no brilho dos vossos olhos e na alegria do vosso rosto.” Foi esse brilho e essa alegria que anunciou o encontro com um tesoiro. Esta história não vos recorda o episódio da Samaritana quando, depois de ter encontrado Cristo, Água Viva foi à cidade e arrastou consigo uma multidão? (cf Jo 4, 28-30)

3. O principal efeito do encontro com Cristo Ressuscitado é ressuscitar n’Ele. Trata-se de uma verdadeira Graça vivida que nos transmite os mesmos valores de Jesus, induzindo-nos a tomar as mesmas opções dele e a assumir os seus critérios, sendo o principal fazer a vontade do Pai. Quando a sua vontade estiver em todas as fimbrias do nosso ser, não podemos calar isso mesmo que Deus nos diz e revela para a nossa vida e para a vida do mundo.

D. Rui Valério

Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança,

Membro da Comissão Episcopal da Missão e Nova Evangelização

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